Não. Eu dizia e dizia, mas não parecia importar muito. Seus olhos azuis ainda continuavam azuis e os nossos sentimentos não haviam mudado. Ainda éramos os mesmos. Nós, sem nada diferente. Exceto pelo fato de ela estar ligeiramente pálida.
-O que há de errado comigo? – Marta continuava a perguntar – Por que me olha assim?
Não sabia responder. Apesar de tudo ser o mesmo, algo nela me parecia estranho. Nada familiar, fúnebre. Sua palidez era o que menos importava. O brilho de seus olhos desaparecera e seus doces lábios estavam finos e ressecados como nunca estiveram antes. Seus cabelos avermelhados estavam despenteados e desgrenhados. Parecia malcuidada, mas isso também não importava muito.
-Me responda, o que há de errado comigo? – Sua feição fez-se de choro, mas não brotou lágrima alguma de seus olhos. Continuavam frios, em antítese a seu rosto inteiro, que, mesmo pálido, simulava um choro.
-Eu não sei, Marta. Mas há algo diferente. – Tentei me lembrar de quando a vira pela última vez. Um dia antes. Estava cheia de vida, mais do que nunca. Que boa a viagem tinha sido! Mas não parecia se contentar. Queria mais, mais e mais. Queria se divertir.
Imagens do acidente pipocaram em minha cabeça. Lembrei-me. Minutos antes, quando caíamos do barranco. Como doía! Olhei para o braço e vi o sangue brotando, frio e veloz. Olhei ao redor.
Estávamos nas areias da praia. Como o meu braço doía, Deus! Olhei para ela e pude ver todo o cenário. Marta me encarava, fria e chorosa, onde o mar começava a subir. Era noite, e como estava muito frio, tive vontade de tirá-la de lá. Não consegui, estava preso.
Ela olhou um pouco adiante de mim e então sua feição viajou de angústia para temor. Seus olhos, escancarados e áridos, esbugalhavam-se, enquanto os lábios finos comprimiam-se em um incômodo e agonizante trincar de dentes. Estava apavorada.
Olhei na direção que ela olhava, pela primeira vez. Não, já tinha visto tudo isso antes. Acho que tinha me distraído com a curiosidade sobre o que havia mudado e me esqueci do que tinha acontecido. Que tragédia, que lástima!
Foquei-me no banco do passageiro. Lá estava, também, Marta. Os cabelos avermelhados desgrenhados e umedecidos em um líquido vermelho; os olhos abertos, embora longínquos e sem um fio de vida; os lábios trincados e levemente abertos, mostrando os dentes impecavelmente escovados, brancos e brilhantes. Mas ela não estava realmente lá.
Olhei de novo para a outra direção. Lá estava Marta. Os olhos azuis agora reluziam à luz da lua cheia e os cabelos pareciam recém-escovados. Os lábios brilhavam em um sorriso brando. Suas vestes, antes puídas e manchadas de sangue, agora eram de uma seda branca e leve que batia insistentemente na pele macia e clara como neve. E por fim, sumiu.
Marta sumiu, dando origem a uma luz e a uma névoa que carregava consigo um sentimento de paz e realização quase tangíveis. Foi aí que senti. Eu estava sozinho, apenas com o corpo sem vida da antiga Marta ao meu lado. Aquela para a qual eu não ousaria olhar, por medo de que essa visão apagasse de minha memória a lembrança de que eu acabara de adquirir.
Não. Eu dizia e dizia, mas não parecia importar muito. Seus olhos azuis ainda continuavam azuis e os nossos sentimentos não haviam mudado. Ainda éramos os mesmos. Nós, sem nada diferente. Exceto pelo fato de ela estar ligeiramente pálida.
-O que há de errado comigo? – Marta continuava a perguntar – Por que me olha assim?
Não sabia responder. Apesar de tudo ser o mesmo, algo nela me parecia estranho. Nada familiar, fúnebre. Sua palidez era o que menos importava. O brilho de seus olhos desaparecera e seus doces lábios estavam finos e ressecados como nunca estiveram antes. Seus cabelos avermelhados estavam despenteados e desgrenhados. Parecia malcuidada, mas isso também não importava muito.
-Me responda, o que há de errado comigo? – Sua feição fez-se de choro, mas não brotou lágrima alguma de seus olhos. Continuavam frios, em antítese a seu rosto inteiro, que, mesmo pálido, simulava um choro.
-Eu não sei, Marta. Mas há algo diferente. – Tentei me lembrar de quando a vira pela última vez. Um dia antes. Estava cheia de vida, mais do que nunca. Que boa a viagem tinha sido! Mas não parecia se contentar. Queria mais, mais e mais. Queria se divertir.
Imagens do acidente pipocaram em minha cabeça. Lembrei-me. Minutos antes, quando caíamos do barranco. Como doía! Olhei para o braço e vi o sangue brotando, frio e veloz. Olhei ao redor.
Estávamos nas areias da praia. Como o meu braço doía, Deus! Olhei para ela e pude ver todo o cenário. Marta me encarava, fria e chorosa, onde o mar começava a subir. Era noite, e como estava muito frio, tive vontade de tirá-la de lá. Não consegui, estava preso.
Ela olhou um pouco adiante de mim e então sua feição viajou de angústia para temor. Seus olhos, escancarados e áridos, esbugalhavam-se, enquanto os lábios finos comprimiam-se em um incômodo e agonizante trincar de dentes. Estava apavorada.
Olhei na direção que ela olhava, pela primeira vez. Não, já tinha visto tudo isso antes. Acho que tinha me distraído com a curiosidade sobre o que havia mudado e me esqueci do que tinha acontecido. Que tragédia, que lástima!
Foquei-me no banco do passageiro. Lá estava, também, Marta. Os cabelos avermelhados desgrenhados e umedecidos em um líquido vermelho; os olhos abertos, embora longínquos e sem um fio de vida; os lábios trincados e levemente abertos, mostrando os dentes impecavelmente escovados, brancos e brilhantes. Mas ela não estava realmente lá.
Olhei de novo para a outra direção. Lá estava Marta. Os olhos azuis agora reluziam à luz da lua cheia e os cabelos pareciam recém-escovados. Os lábios brilhavam em um sorriso brando. Suas vestes, antes puídas e manchadas de sangue, agora eram de uma seda branca e leve que batia insistentemente na pele macia e clara como neve. E por fim, sumiu.
Marta sumiu, dando origem a uma luz e a uma névoa que carregava consigo um sentimento de paz e realização quase tangíveis. Foi aí que senti. Eu estava sozinho, apenas com o corpo sem vida da antiga Marta ao meu lado. Aquela para a qual eu não ousaria olhar, por medo de que essa visão apagasse de minha memória a lembrança de que eu acabara de adquirir.
Não. Eu dizia e dizia, mas não parecia importar muito. Seus olhos azuis ainda continuavam azuis e os nossos sentimentos não haviam mudado. Ainda éramos os mesmos. Nós, sem nada diferente. Exceto pelo fato de ela estar ligeiramente pálida.
Adorei!
ResponderExcluirComo você escreve bem! Cada vez melhor!
Parabéns! Sucesso sempre!
Beijo de saudade...
Mamãe